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Apartamento 203

     Aos 15 anos minha mãe e eu nos mudamos para nosso novo apartamento. O Edifício Rubi ficava no centro de São Paulo, e por maior que seja o meu esforço, não consigo lembrar ao certo o bairro, apenas que da minha sacada podia ver uma grande torre espelhada sobre um prédio branco e, do outro lado, um grande parque em meio à cidade. Era um condomínio de luxo — disso eu me lembro bem —, e sua escolha foi estratégica para minimizar os riscos à nossa segurança, afinal: com um mercado dentro do condomínio, tínhamos tudo que necessitávamos entre suas três torres, saindo apenas para trabalho — no caso da minha mãe —, escola ou lazer.

     De certa forma, porém, eu não estava tão contente com a mudança. Meus pais haviam se separado há poucas semanas antes de nos mudarmos e talvez minha mãe tenha enxergado esse novo apartamento como um ambiente para recomeçarmos, mesmo que em nenhum momento me foi perguntado se isso era o que eu realmente queria. Não que nossa situação anterior estivesse melhor, o processo de separação dos meus pais não foi necessariamente fácil para a gente — e até preciso admitir que acordar com sua mãe chorando de madrugada não é o passatempo favorito de nenhuma filha —, mesmo assim, seria legal se ao menos tivessem me dado a ilusão da escolha, especialmente porque a relação que tinha com minha mãe era algo bem próximo, e tanto ela quanto eu nos sentíamos livres o suficiente para compartilharmos nossas segredos, e mesmo assim — quando ela precisava mais —, não foi capaz de compartilhar comigo um momento que tanto lhe fazia mal. De qualquer forma, quisera eu seu único segredo ter sido esse.

+ + +

     Lembro até hoje de quando ele apareceu em minha vida. Eu cheguei em casa após mais um dia de escola e, como de costume, minha mãe estava em mais um plantão médico, mas grudado em nossa geladeira com alguns ímãs ela deixou um pequeno recado falando sobre o que tinha para comer na geladeira. Eu teria a casa toda para mim até as 18 horas, quando ela chegaria, mas sem internet ou TV a cabo, não tinha muito com o que me entreter, então após o almoço tentei agilizar a tarefa de casa sobre matrizes — ou algo assim — para ter o restante da tarde livre, e após quase trinta minutos fechei meu caderno com a sensação de dever cumprido. O relógio, porém, ainda me passava a sensação excruciante de que algumas horas me separavam de qualquer mínima interação com outra pessoa, e sem a menor vontade de assistir qualquer programação da TV aberta, eu me vi obrigada a ir até a sacada, talvez admirar a vista, talvez pensar em algo a se fazer.

     Uma lágrima escorreu do meu rosto nesse momento. Apenas uma, que logo secou conforme escorreu pela minha pele. Lembrei de todos os amigos que deixei em meu antigo bairro. Não eram muitos e eu provavelmente conseguiria contar nos dedos aqueles que eu realmente gostava dentre o grupo de quinze crianças da rua. Tínhamos até mesmo um grupinho que em nossos maiores delírios jurávamos ser inseparáveis: Taissa, Natalia, Veronica e Victor — o único garoto que admitimos em nosso círculo de amizade, especialmente por não se dar tão bem com os outros garotos, que constantemente o zombavam por conta do peso. Ainda assim, ele sempre se demonstrou extremamente sensível, então acabamos o adotando como parte do nosso grupo, mas naquela tarde, olhando para as nuvens que corriam o horizonte, senti-me triste. Agora meus amigos estavam do outro lado da cidade, e não sabia ao certo se eu os veria novamente, ou se eles ainda me considerariam como parte do grupo se um dia eu voltasse... Na verdade, eu não sabia nem ao menos se eles queriam que eu voltasse.

     Todos aquelas incertezas me faziam querer abandonar tudo. Não sei, pegar qualquer moeda que encontrasse pela casa e torcer para não subir no ônibus errado rumo ao nosso antigo bairro, mas lá estava eu, presa no vigésimo andar de um bairro que ninguém me conhecia. Eu quase me senti traída por meus pais, como se por quinze anos precisasse utilizar as poucas habilidades sociais que tinha para, quando eu finalmente me sentisse mais confortável perto de alguém, eles tirarem isso de mim. Tudo aquilo parecia tão injusto que o impulso de gritar a plenos pulmões subiu por meu peito, mas antes que pudesse finalmente externá-lo, parou em minha garganta quando olhei para baixo.

     Além de nossa malha de proteção, no playground do térreo, um garoto olhava diretamente para a minha sacada. Ele estava parado sobre um montinho de areia, longe de todas as outras crianças que brincavam espalhadas pela área. Estava sozinho, imóvel, quase como se estivesse passando mal e não pudesse se mexer, apenas olhando em minha direção. Por alguns segundos eu o encarei. Tentei desviar meu olhar, mas algo em mim tornava aquela tarefa quase impossível, como se nossos olhares estivessem conectados e eu pudesse compreender exatamente o que ele queria me dizer. Sentia nele uma certa ternura, ou talvez uma confiança que ia além de qualquer outra que jamais experienciara, mas acima de tudo, ele era o garoto mais lindo que eu já vi em toda a minha vida. Todo aquele misto de sentimentos geravam em mim um aumento de ansiedade assustadoramente traduzida em uma breve hiperventilação, que logo me arrancou do transe, afastando-me da janela e derrubando-me no sofá.

     Eu estava assustada, lacrimejando e tudo que eu queria naquele momento era minha mãe. Não tinha certeza do porque estava naquele estado, mas algo em mim chamava por aquele garoto e eu precisava conhecê-lo.

+ + +

     No dia seguinte, mal pude prestar atenção em meus professores. Seu olhar parecia ter se instaurado em minha alma como um parasita. As aulas se tornaram extremamente arrastadas, e em cada um de meus professores podia apenas ver seu rosto e imaginar sua voz. Algumas vezes pedi licença para deixar a sala e andar pelo colégio na esperança de espairecer um pouco, em outras eu apenas fechei os olhos enquanto descansava a cabeça na parede — esperando que, como uma dor de cabeça, aquela repentina obsessão pelo garoto do playground fosse embora. As tentativas, porém, foram em vão, e até mesmo no intervalo, quando algumas garotas tentaram se aproximar, eu não estava necessariamente ali. No cantinho do pátio, recolhida em uma cadeira longe de todos, perdi-me em meus pensamentos e novamente fui levada ao seu olhar. Por alguns instantes eu apenas temi que talvez tenha perdido a oportunidade de conhecê-lo, e naquele momento diversas dúvidas pairavam em minha cabeça, porém todas convergindo ao mesmo
ponto: se eu o visse novamente, não pensaria duas vezes antes de descer em seu encontro, e felizmente esse momento estava mais próximo do que o esperado.

     Quando cheguei em casa naquele mesmo dia, minha mãe não havia apenas preparado o almoço, mas o colocado também em meu prato, e após alguns minutos de conversa, coloquei minha mochila sobre a cama, almocei rapidamente — o suficiente para levar uma leve bronca sobre ter indigestão —, e tão rápida quanto saí da mesa, dirigi-me à sacada. Para minha alegria, lá estava ele. Como no dia anterior, o garoto sobre o monte de areia olhava fixamente para o meu apartamento, quase como se não tivesse se mexido desde o dia anterior, e, claro, aquilo me fez sorrir num acesso de felicidade genuína que não sentia há semanas. Podia sentir meu coração palpitar de ansiedade, e meu estômago ficar mais leve com todas as borboletas colidindo em seu interior. Tentei acenar, mas ele continuava parado, e por algum motivo
eu me convenci de que, ou ele era tímido, ou não estava me vendo, e independente da resposta, corri
em direção à porta de casa sem dar muita satisfação para minha mãe, apenas dizendo que voltaria logo.
Pulei no primeiro elevador que chegou em meu andar e, com as pernas tremendo, aguardei os quase dois
minutos até chegar no térreo, de onde corri em direção ao playground.

     Estava ofegante e esperançosa, mas tão rápido quanto corri a seu encontro, o sorriso deixou meu rosto quanto me vi frente ao monte de areia em que o garoto se encontrava até poucos minutos atrás. Pensei comigo que ele pudesse ter saído para almoçar, ou até mesmo se afastado dali para retornar o quanto antes, e na esperança de conhecê-lo eu aguardei em um dos bancos de madeira enquanto via um grupo de crianças brincando do outro lado da quadra. Os minutos começaram a se passar, e após uma hora de espera uma grande nuvem acinzentada me obrigou a voltar para casa. Eu não estava necessariamente contente, mas algo dentro de mim me dava pequenos tapinhas nas costas como um certo reconhecimento de que ao menos eu tentei, e que amanhã poderia ser diferente.

     Em meu apartamento, fechei as janelas e aproveitei o clima chuvoso para ler um de meus livros enquanto não instalávamos a TV a cabo. Lembro-me de não ter conseguido focar em minha leitura. Andava com os olhos por entre as linhas e não conseguia me encontrar em nenhum dos parágrafos. Eu me imaginava naquele banco, talvez naquele mesmo momento em que estava lendo, porém sendo recebida por aquele garoto, que me convidaria para passar a tarde com ele; e antes que pudesse notar, teria que voltar ao início do parágrafo quando percebesse que em nenhum momento eu estava realmente ali.

     Não dormi bem naquela noite. A chuva se estendeu madrugada adentro e por alguns minutos me lembrei dos momentos que tive com meus amigos de nossa antiga casa. Em tempestades como aquela, contrariaríamos nossos pais ao brincar na rua para — no dia seguinte — pegarmos um leve resfriado acompanhado de um longo sermão sobre pneumonia e outras coisas que, honestamente, nunca entendi. Foi apenas quando me concentrei para bloquear meus pensamentos que consegui finalmente dormir, mas senti como se as quase 6 horas de sono tivessem passado em apenas 15 minutos, especialmente ao notar que a chuva continuava do lado de fora, com os raios solares da manhã encontrando caminho por entre as rápidas gotas que rasgavam o ar feito navalhas. Levantei-me rapidamente e me arrumei para a escola junto de minha mãe, que saiu ao trabalho antes que o transporte escolar chegasse em nosso prédio.

     Hoje eu me arrependo de não ter aproveitado mais aquele dia letivo. Uma dor de cabeça descomunal me atingiu durante a segunda aula — talvez pela noite anterior —, e eu até tentei dormir um pouco no fundo da sala, e seria uma tarefa fácil se não pelo ambiente quase animalesco do ensino médio. Por volta da metade da terceira aula, meu corpo entrou por algumas horas numa espécie de crise de ausência que perdurou até o fim do período quando o sinal ecoou pelas paredes do colégio e me devolveu a consciência. A dor estava mais branda, mas ainda podia senti-la, e a primeira coisa que fiz ao chegar em casa foi buscar a caixa de medicamentos em nosso quarto.

     O apartamento ainda estava uma bagunça. Havia caixas empilhadas em todos os cantos, tornando a tarefa de encontrar o remédio cada vez mais complicada. Foram quase 10 minutos até finalmente encontrá-los em uma caixa no topo do armário. Tirei alguns álbuns de fotos da caixa maior e, no fundo — ao lado do que juguei ser um porta-joias — peguei a cartela de comprimidos no kit de primeiros socorros de minha mãe. Fui à cozinha pegar um copo d’água para engolir o remédio e levei o porta-joias comigo. Nunca o tinha visto, e seus adornos me chamavam muita atenção, mas a dor estava voltando e parecia cada vez mais intensa.

     Levei o comprimido e a água até a sacada, onde o engoli junto de uma prolongada respiração. A chuva já havia parado, e com ela o ar úmido carregava uma leve brisa que parecia abraçar meus pulmões. Sempre fui apaixonada no cheiro de terra molhada, mesmo que — naquela altura — era muito raro senti-la, mas imaginá-la era quase terapêutico. Se eu tivesse uma rede, poderia passar a tarde toda naquela sacada apenas aproveitando a leveza do ar, mas algo me trouxe de volta à realidade. Ouvi alguns gritos vindo do térreo — provavelmente alguma criança brincando de pega-pega —, e logo me apoiei sobre a tela de proteção da sacada.

     Ele estava lá.

     Sobre a mesma caixa de areia do dia anterior, aquele garoto permanecia de pé olhando para cima. Por alguns segundos eu apenas esqueci de minha dor, e numa injeção de adrenalina eu corri para o elevador. Tamanha empolgação, acredito ter esquecido de trancar a porta de casa, pois antes mesmo de perceber eu já havia descido os 20 andares de minha torre e percorrido os quase 100 metros desde o saguão até o playground, mas — novamente — ele não estava lá.

     Eu estava exausta, mas decidida a encontrá-lo naquele dia. Algo em mim julgava impossível ele desaparecer dois dias seguidos, e na esperança de que ele estava no banheiro ou algo do tipo, decidi sentar em um dos bancos junto a uma senhora que acompanhava seu neto enquanto ele jogava futebol com amigos.


     Cerca de cinco minutos se passaram, mas não havia sinal dele. Resolvi perguntar à senhora sobre o garoto, e mesmo não o conhecendo, ela também acreditava que logo, logo ele estaria ali, especialmente por lembrar de um garoto com as características que descrevi. Após meia hora sem nenhum indício de que ele voltaria, a mulher me desejou boa sorte e subiu com seu neto ao seu apartamento. Após uma hora, o tempo começou a se fechar; depois de duas, o frio estava quase insuportável, e após três horas eu apenas desisti de esperá-lo. Meu estômago doía pedindo por comida e meus dentes rangiam com a corrente de ar que passava por mim. Sentia que a qualquer momento minha dor de cabeça pudesse voltar, e quando os últimos raios de Sol foram cobertos pelas nuvens cinzas da cidade, eu decidi voltar ao apartamento.

     Não estava feliz. Obviamente queria encontrá-lo, mas tudo aquilo parecia até uma piada enfadonha por parte do Universo. Ao menos eu já estava em casa, e após colocar roupas mais apropriadas para o frio, coloquei meu almoço para esquentar no micro ondas e parei em frente ao balcão da cozinha. Toda aquela situação me fizera esquecer o porta-joias, então decidi abri-lo enquanto meu almoço não ficava pronto. Sua beleza nos menores detalhes — do topaz cravejado em sua tampa aos detalhes que lembravam uma ametista em sua lateral — eu me senti quase como uma pirata que, frente ao tesouro de sua vida, encontraria a felicidade após anos em alto mar.


     Fui surpreendida com uma série de documentos dentro dele. Organizei-os ao lado da caixa para que pudesse comer enquanto os lia. Eram muitos e todos datavam há pouco mais de 15 anos. Alguns eram totalmente negros e plásticos, fazendo sons estranhos ao chacoalhá-los — quase como trovoadas a depender da velocidade. Parecia ter algo escrito neles, mas sua leitura era realmente complicada.

     Junto dos documentos, uma única joia se destacava dentre todas as papeladas: um pequeno bracelete de ouro com a letra G, muito parecido com o que eu tinha quando era um bebê, com a diferença de que a letra do meu era a inicial de meu nome: Izabelle. Mamãe sempre contou a história de que minha avó o mandou fazer para que saíssemos da maternidade com ele em meu punho. Aquele, porém, nunca me foi apresentado.

     Num outro envelope, dobrados em quatro partes, dois papéis foram guardados juntos. Separei-os e coloquei meu prato de lado quando li seu título. Em letras garrafais sob o brasão da república, as palavras "Certidão de Nascimento" me atingiram como uma faca. Meu estômago embrulhou a medida que meus olhos escaneavam a certidão de um garoto de nome Gabriel, não apenas registrado em nome de meus pais, mas nascido no mesmo dia do meu aniversário — com a lacuna de "Gêmeo" preenchida com um simples "Sim".

     Eu não conseguia sentir nada naquele momento. Não me haviam forças para sentir quaisquer tipos de indignação por terem me escondido o fato de eu ter um irmão que todos da família acreditara ser divertido me manter no escuro. A minha resposta, porém, não tardou, e abrindo o outro documento eu não consegui lê-lo por completo quando, em letras tão grandes quanto o último, a frase "Certidão de Óbito" me fez largá-lo sobre a bancada enquanto uma leve tontura me fez buscar um assento.

     Meu coração começou a bater mais rápido, e segurando o máximo de lágrimas que pude, devolvi todos os documentos ao guarda-roupa enquanto hiperventilava. Pude sentir o peso do mundo em meu peito, e — como resposta fisiológica, ou não — a dor de cabeça se intensificava de forma quase exponencial. Deitei em minha cama na expectativa de que, com o quarto escuro, a dor pudesse desaparecer, mas o turbilhão de pensamentos em minha cabeça pareciam me dilacerar viva. Tentava a todo custo me segurar em qualquer resquício e tranquilidade que atravessasse meu olhar enquanto a deriva num revolto oceano de pensamentos, e — após perder a noção do tempo em minha própria mente — fui levada por uma inebriante nuvem onírica que me carregou quase como um ato de misericórdia para longe daquele maldito apartamento.

     Lembro-me de acordar às 3 da manhã com o clarão de um relâmpago seguido por um trovão que perturbara as fundações do edifício. A dor em minha cabeça permanecia insuportável, então me levantei com cautela para não acordar minha mãe — que dormiria mais algumas horas antes de voltar ao plantão —, fui até a cozinha e peguei mais um copo d’água para tomar outro comprimido. Queria tomar um banho quente, mas provavelmente seria despertada e não aguentaria ficar acordada durante as aulas, então eu só tomei o medicamento e fui à sacada respirar antes de voltar para a cama.

     A chuva, agressiva, era carregada pela ventania e agredia meu rosto como agulhas. Pude sentir a colisão de cada gota contra minha pele como uma sessão de acupuntura: igualmente relaxante e agonizante. Não queria perder muito tempo de sono — provavelmente o remédio faria melhor efeito enquanto dormisse —, então respirei uma última vez o ar da sacada e, sem motivo algum, olhei para o Playground.


     Sobre o monte de areia, ensopado pela chuva e iluminado por um único poste de luz, o garoto permanecia de pé como uma estátua. Seu olhar continuava fixado em meu apartamento, quase como se quisesse me dizer alguma coisa. A sensação desesperadora de vê-lo ali durante a madrugada me causou certa angústia, fazendo meu coração bater cada vez mais rápido até que se tranquilizasse. Eu precisava encontrá-lo.

     Caminhei até a cozinha a procura da chave da porta.


     Não...

     Abri a terceira gaveta da pia e peguei uma tesoura. Pé ante pé, carreguei a cadeira da cozinha em direção à sacada e fiquei em pé sobre seu estofado enquanto manejava calmamente o utensílio.

203


     Ele sempre esteve ali...

 

153

 

     Eu apenas não fui rápida o suficiente para encontrá-lo...

 

103

 

     Mas nós finalmente poderíamos ficar juntos no playground...

53

     Nós finalmente ficaríamos juntos para sempre!

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©2022 por Dżejk Obleszczuk

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